Seis da tarde


Seis da tarde, hora da Ave Maria. No fogão de quatro bocas a sopa de legumes com carne em pedaços. 
Ele estava sentado ao lado da mesa, com o rádio pertinho. Ela colocava os pratos.
A água estava no copo - ficava benzida após a oração - e a banana descascada deixava o cheiro no ar. 
Meio de semana. Não era costume visitá-los assim, mas naquele dia desci as escadas e fui. Cheguei quieta, não ia interromper a reza, e só depois os cumprimentei. 
_Janta com a gente!
Peguei outro prato. Adorava aquela sopa.
_Vô, conta sobre o sítio!
O rosto dele iluminava quando contava suas histórias e, após um dia cansativo, só queria ouvir uma história conhecida. 
_Me dá uma felicidade quando você vem aqui! - Nunca vou esquecer essa frase. Meu avô, 90 anos, a disse em sua última semana de vida. Não, vô, a felicidade era toda minha.
Eu é que era feliz em pisar naquele quintal de caquinhos vermelhos que cheirava infância. 
Os anos passaram. Meu avô já não ouve mais o jogo do São Paulo na terra. Minha avó já não sabe mais fazer bolinhos de pinga. Sozinha, espera o cessar dos dias que lhe foram reservados.
Meu filho hoje dorme no berço, pouquinho de sangue espanhol nas veias. A conheceu no último Natal, quando fraquinha, pegou em sua mão sem forças para tê-lo no colo.
Estamos distantes, bem distantes. Talvez não a veja mais. O que fica é aquele dia, aquele cheiro, aquela paz que só os avós são capazes de dar. Aquela saudade.