Reconstrução

Acordou naquela manhã com um vazio no estômago e no peito. Não sabia se era fome ou tristeza. Talvez fossem os dois.

Passou as mãos no seio e caiu no choro.

Não entendia como aquilo tinha acontecido justamente com ela, que sempre fora tão feliz.


(Mas, será que a tristeza é direito apenas dos que sempre foram tristes?)


Havia acabado de fazer a cirurgia para retirada de um caroço na mama, e parecia que além da mutilação do corpo, haviam lhe tirado os sonhos. Apesar de toda força do marido, não permitia que a visse nua.

Dia a dia caía cada vez mais em depressão. Não tinha vontade de sair da cama, de cuidar dos filhos, de ir para academia. Já não fazia mais amor, não regava as plantas, nem tampouco se olhava no espelho.

Seu humor estava tão ruim que ninguém conseguia ficar perto. No começo tentaram animar, mas sem sucesso, se afastaram.

Um dia, sentada na beira do precipício de si mesma, olhou em volta e se viu sozinha. Ali, apenas ela, sua mágoa, e seu meio seio.

Ligou para o marido.

_Preciso de você!


(Há de se chegar o momento em que a esperança vencerá o cansaço.)


Acordou novamente sentindo um vazio imenso no estômago, mas desta vez sabia ser fome.

Outra cirurgia, outra chance.

A reconstrução da mama lhe trouxe a certeza de que é possível reconstruir o corpo e a vontade de viver.