Sentados num café, ele desabava seu dissabor nos velhos ouvidos dela. Nem eram tão amigos assim, mas estava precisando desabafar.
_E foi assim que você levou um pé na bunda?
_Não sei exatamente se é um pé na bunda.
_Ué, e é o que?
_Um ponto final num relacionamento complicado.
_Ah, dá na mesma, vai!
A claridade de raciocínio daquela mulher cinquentona não era tão fácil de encarar. Às vezes a gente precisa de palavras que amenizem o momento.
_Acha mesmo que levei um pé na bunda?
_Sim, levou!
Ele pára, pensa como não tinha pensado antes. Chega à conclusão de que sim, levou mesmo o tal pé na bunda e se pergunta, e agora?
_Você gosta dela?
_Não sei.
_Gosta ou não gosta?
_Não sei!
_Se não gostasse, não estaríamos aqui. Se não gostasse, não ficaria gelado ao pensar que ela vai embora da sua vida.
_Será?
_Se não gostasse, não ficaria sem concentração e chamaria sua colega de trabalho para um café no meio da tarde em plena segunda só para falar dela.
_É, pode ser.
_Ou então, é ego!
_Não, ego não.
_Então, gosta dela.
_É, acho que gosto.
_Acha?
_Gosto. Tá, eu gosto.
_Vai procurá-la?
_Não.
_Então, não gosta.
_Já disse que gosto, caramba!
_Se gostasse, a chamaria para conversar.
_Não consigo. Mas eu gosto dela sim!
_Dela eu sei. Não gosta mesmo é de você!
[Negação. Ato ou efeito de negar. Não assumir, bloquear. Bloquear-se. Estar inapto a enfrentar a verdade. Não querer enxergar. Fugir. É, fugir.]
[Negação. Ato ou efeito de negar. Não assumir, bloquear. Bloquear-se. Estar inapto a enfrentar a verdade. Não querer enxergar. Fugir. É, fugir.]