"O mundo do som do piano, das sapatilhas gastas, do brilho no olhar de corpos inquietos, e corações que pulsam em oito tempos"
Separei meus sonhos cor de rosa e os embalei com cuidado para levá-los com segurança à casa nova. Sonhos são como taças de cristal, quebram com facilidade e custam caro.
Tão caro que quando não acontecem, ainda que sejamos maduros para encarar a perda, ficam em nosso subconsciente até se concretizarem de alguma forma secundária. Assim é o ballet.
Não fui bailarina, não serei, mas transportei a dança para o futuro, contemplando ainda que imaginariamente o dia em que veria uma menina entusiasmada deslizando pela minha casa com suas sapatilhas e seu collant. Claro que a menina não sou eu, mas um fruto vindo de mim.
Sei que as escolhas nos levam por caminhos nem sempre esperados e que talvez, embora com muito incentivo, minha futura filha nem goste de ballet e música clássica. Pode ser que prefira rock, reggae.
Pode ser que tampouco goste de música, literatura, e que nem se encante pelos rodopios de uma apresentação de Lago dos Cisnes, como eu. Mas, só sonhar com isso já me desperta um sorriso.
E assim é a beleza de suspirar pelos cantos. Pode ser que nunca façamos aquele pensamento seguir adiante. Que ele nunca saia da gaveta, dos planos, dos desejos. Pode ser que mude com o tempo ou que nunca ultrapasse a barreira da imaginação, mas, enquanto esteve ali, enquanto se tornou parte do nosso dia, enquanto fez nosso coração bater mais forte, já foi suficiente, já cumpriu seu papel de sonho.
Essa é a harmonia da simetria - aquela perfeita junção que aprendemos na dança e que nos segue pela vida. A simetria leve de um passo bem dado é a certeza de que a música valeu a pena - e valerá, porque enquanto a gente for capaz de respirar, há chance de ver o sonho se transformar.
(...)