Atemporal, como devia ser.
Andei na garoa fina como quem anda no sol forte.
Na mesma rua, mesma luz, mesma pressa.
Presa fácil de si mesma, escalei minhas lembranças até chegar onde não sabia.
Passei por pessoas inertes, pessoas, pessoas. Todas elas, nenhuma delas.
Em apenas um segundo, me vi refletida na poça onde um dia me encontrei.
(...)
O menino que mentia a idade
Mais que meus olhos poderiam enxergar.
Menino que quase não falava.
Tímido que só, ninguém, por mais dias que dividissem, o conhecia.
Poucos amigos, muitas habilidades, pulso firme e fala mansa.
O das violetas, olhar temoroso e andar altivo.
Aquele que pouco mudava, que nada contava, que cabia dentro da caixa que um dia se enfiou.
O que se frustrava com a morte do pai, se orgulhava do dinheiro na conta.
Menino inteligente, por vezes tão preso em suas limitações.
Ciumento, passional, inofensivo e ofensivo.
Menino que lê, que detalha, que sorri, mas esconde o choro.
O que vai embora, fecha a porta, mas não diz adeus.
Menino que aprisiona e não se liberta. Menino que sofre, mas finge felicidade.
Que sonha. Sonha? Acho que sim.
Ah, o menino de olhar de fogo. Aquele que arde, que vibra e depois queima.
O que toca, o que congela, o que teme, mas mostra coragem.
Que se contradiz, mas insiste e você acredita.
Menino que passa, que a vida leva, que não se vê nem se comenta.
Menino que lamenta, no fundo, ser esquecido pelo tempo.
[Menino que mentia a idade. Menino que desmentia o amor.]