Revelar


Ligou o gravador. Deixou-se conduzir pelos olhos castanhos, pela pele marcada e pela vida exposta de Seu Itamar. Histórias - era isso que ela respirava. 
Mas não bastava escrever essas histórias, tinha que agregá-las, uma a uma, em uma espécie de enciclopédia cheia de contos do cotidiano, aos quais ouvia sempre com curiosidade e fascínio.
Fizera jornalismo porque queria ser escritora, mas não gostava dos casos reais. Sem saber, caiu na armadilha de transformar essa realidade em fictícios personagens temáticos e influentes, não ao mundo, mas a ela. E assim, a cada nova entrevista, lá ia por água abaixo mais um conceito, mais um tabu e mais uma verdade incorreta. 
Aprendeu a questionar, a não ter vergonha de não saber a resposta, a ouvir. Aprendeu a ser apenas uma ponte, um elo, uma ligação entre quem tem alguma coisa pra contar e quem tem alguma coisa para ler.
Mais que isso, aprendeu a aceitar. Aceitar que o verdadeiro jornalista não é aquele que dá um furo, mas aquele que tapa o buraco de si mesmo com sorrisos simples, como aquele que enxergava agora. 


[E não é o mundo que se revela; somos nós que o revelamos dentro da gente, por acaso, quando o relógio chega perto da meia-noite. Abrir o coração é o mesmo que apertar o REC.]