Só conseguia ouvir as gotas d'água caindo sobre o chão. No vidro do carro, elas escorriam uma a uma, fazendo um espetáculo artístico enquanto meu pensamento flutuava.
O engraçado era que em uma noite chuvosa como aquela, me lembrei de um dia de sol.
Revivi por um momento a tarde em que a claridade entrava pela janela sem nenhuma discrição. Sentada na cama eu analisava minhas opções e a decisão que acabara de tomar. As malas arrumadas e o vazio tomando conta de tudo.
Não havia muito o que decidir. Na verdade, estava apenas assumindo.
Palavra difícil essa, assumir.
Enfrentar os medos.
O maior problema era jogar fora os tijolos daquela construção utópica de nossos sonhos estrategicamente planejados.
E o novo se abria como uma cortina branca no meio de uma névoa de fumaça.
As chaves em cima da mesa faziam parte do cenário abstrato que nunca me esqueci.
Agora eram as luzes vermelhas que me fascinavam. Trânsito parado.
Silêncio.
Às vezes é preciso completar-se. Como um quebra-cabeças de dificuldade avançada, temos que um dia descobrir nosso verdadeiro desenho. Aquele que nunca fizemos questão de entender.
E era exatamente nele que estava me concentrando agora, enquanto a chuva dançava e me hipnotizava.