Sobre ser improdutivo


Quase sete da tarde, sexta-feira. Todo mundo do escritório já havia ido embora, mas ela ainda não. 
Olhava para a tela do computador incrédula de como não conseguira render nada o dia todo. 
O sol já se fora, a noite começava, o calor amenizava. O problema era se concentrar, esquecer o caos da sua vida, e escrever. Ah, essas publicações cheias de adjetivos e tão pouca verdade! 
Tentou relaxar. Estava sozinha e podia ficar descalça. Tirou o sapato de salto, tocou o chão de carpete azul marinho. Sentiu saudade do tempo que tomava cerveja na redação do jornal. Até gostava dos fechamentos de madrugada. Tudo que é bom passa rápido. 
Era como escrever rótulos de embalagens de produtos, mentir que excesso de açúcar é saudável e ganhar dinheiro com isso. Dinheiro... 
Ele não estava faltando. Tá, não era rica, mas nem almejava. 
Vai ver era só mais um dia vazio, daqueles que a gente deita na cama e deleta que existiu. Pula e vai pro próximo. E ela estava cheia de dias assim. 
Desligou os aparelhos, calçou o sapato, pegou a bolsa. Trancou a porta da empresa e foi pro bar sozinha. Pediu uma Serramalte. Não ia escrever, ia pensar.